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HISTÓRIAS DE JOSUÉ MONTELLO - VI
20/01/2011 00:10:24


 M. Paulo Nunes

 Deveria esta nota ter como titulo “Di Cavalcanti em dois tempos”, sobre o admirável fixador de retratos de mulatas na história da pintura brasileira, que com ele ganha uma dimensão que poucos tiveram ao tratar  do mesmo tema.

“Por mais fiéis que fossem os retratos de Di Cavalcanti,  é assim que Josué Montello começa a nota de 27 de outubro (1976), de seu Diário do Entardecer, nem um deles se pareceria tanto com o modelo  quanto as suas caricaturas. Porque esses retratos, acrescenta o romancista., fixados ao vivo, na imobilidade do flagrante ou da pose, conservariam algo de caricatural na figura inconfundível” (0b. cit., p. 768)

Diz o autor de Degraus do Paraíso que numa de suas viagens a Paris, encontrou-se com o pintor em seu ambiente natural, ou seja, a rua. Não uma rua qualquer daquela cidade, mas uma rua típica do Quartier Latin, “grave na sua velhice, boêmia nos seus transeuntes, como à espera de outros romances de Balzac”, conforme suas palavras.

Segurando-o pelo braço, em tom imperativo, disse-lhe o pintor:

- Você vai almoçar comigo.

- Já almocei.

- Torna a almoçar.

E lá foram os dois “Boulevard Saint Germain acima, na direção do Boulevard Saint Michel, donos da tarde, senhores da rua,  impelidos pelo passinho do pintor e poeta. De repente, numa esquina, paramos.

“E ele, como a  banhar-se na onda humana que passava por nós:

- Veja isto, é como a nossa  Lapa, nas melhores tardes. A cada instante, uma mulher bonita. Principalmente mulatas, cheias, repletas, a nos chamarem para a cama. Agora, pergunto a você: - Como é que se pode deixar de ser pintor com tanta mulher bonita? Impossível. A vontade  que eu tenho é agarrar todas elas, aos bandos, e  atirá-las para a tela, como num delírio, depois de atirá-las para a cama, como um bode. (Ob. cit., p.769)

Outra observação do pintor, alongando o olhar para uma ruazinha estreita que se torcia na direção do cais do Sena, com aquele ar que possuem todas as ruas de Paris.

“- Veja aquela rua. Não quer sair dali. Segue para o cais, dando volta sempre a se torcer, querendo voltar. Paris é isto. É esta felicidade civilizada. Esta cor. Este movimento. Veja bem: os carros não buzinam, para não espantar esta harmonia.”

 “ E grave, segurando-me os dois braços:

- Será que Deus sabe que isto é assim? Ou continua pensando que o Paraíso é lá?”

 E os dois lá se foram para o Chez Catherine, onde se deparam com uma senhora, “também gorda, e extrovertida, que se atirou nos braços do pintor, como se quisesse entrar, com os restos da beleza contente, num de seus mais belos quadros”. (Ob. cit., idem)

 E concluiu o autor aquela nota, com um tom de melancolia, a mesma melancolia que nos assalta toda vez que reconstituímos, pela memória involuntária, um dos quadros de nosso passado, guardado intacto na lembrança.

“ E eu pergunto a mim mesmo, conclui a nota, com a memória desse encontro em Paris:

- Como admitir que nesta hora, neste Rio de Janeiro ensolarado, estejam levando o querido Di Cavalcanti, de olhos fechados, mãos atadas, visivelmente aborrecido, para o Cemitério São João Batista? (Ob. cit., idem)




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