M. Paulo Nunes
Por iniciativa do acadêmico Herculano
Moraes, tivemos, no último sábado, a realização da sessão conjunta das Academia
Piauiense de Letras e do Médio Parnaíba, em homenagem aos 120 anos de
nascimento do poeta amarantino Da Costa e Silva, ocorrido a 23 de novembro de
1885.
Além de seus presidentes, acadêmicos
Paulo Freitas e Afrânio Nunes, que conjuntamente a presidiram, com um auditório
seleto constituído de amarantinos e regenerenses, além de membros de nossa
Academia, discorreram sobre o poeta, de acordo com a ordem de programação, o
que escreve esta nota e o acadêmico e poeta Hardi Filho, ocupante da cadeira
fundada pelo poeta de Zodíaco.
Dissemos ali algumas palavras, de improviso,
que vão a seguir resumidas.
Destacamos o fato de ser o poeta a
figura angular de três correntes literárias, o simbolismo, com Sangue,
sua obra de estréia, em 1908, o parnasianismo, que se seguiu àquela com Zodíaco
e, finalmente, o modernismo, em alguns poemas de feição modernista, como
“Carossel Fantasma”, “Refrão do Trem Noturno” e “Carnaval”, que o poeta
pretendia reunir futuramente em um outro livro, Alhambra, que não chegou
a publicar. Ao mesmo tempo, se apresenta ele como neo-clássico, em Pandora,
em que revive as formas do seiscentismo português ou a temática greco-latina,
especialmente nos”sonetos de Eleusis”, contidos nesse mesmo livro, como ainda é
o poeta elegíaco de Verônica, inspirado pela morte da mulher amada, a
doce companheira Alice Sales Salomon.
Destaquei, naquela oportunidade, como
já o fizera anteriormente em estudo sobre o poeta, os dois aspectos
significativos na lírica do poeta, o saudosista e o elegíaco, de par com a sua
identificação com a paisagem do rio Parnaíba, uma temática dominante em sua
obra, como no famoso soneto “Rio das Garças”, em que se identifica com o
destino do “velho monge”, ao dizer no terceto final, do livro Sangue:
“É o Parnaíba assim carpindo as suas
mágoas,
-Rio da minha terra ungido de
tristeza,
Refletindo o meu ser à flor móvel das águas.”
Como saudosista, na linha da grande
poesia portuguesa, como a de Garret, que a definia como “gosto amargo de
infelizes” temos sua presença em várias composições do poeta como aquela de Pandora,
o seu livro fiel ao modelo clássico, como já o dissemos:
“Saudade!
Es a ressonância De uma cantiga sentida/ Que embalando nossa infância/ Nos
segue por toda a vida”.Mas esse saudosismo que está presente em grande parte
dessa alta poesia, e que se tornaria emblemática no soneto “Saudade”, que todo
piauiense sabe de cor, se reflete ainda em outro grande soneto em que
redescobre a terra natal e não resistimos ao desejo de cita-lo integralmente, e
se contém em seu livro Pandora:
“Quando a minha saudade os olhos
cerra,/ Na grata evocação de um sonho errante,/ Recordo, enternecido, a minha
terra,/ Vendo-a mais linda quanto mais distante.
Ao longe, um panorama se descerra/ Sob
o límpido céu, ao sol radiante:/ Entre os rios, as árvores e a serra,/
Branqueja a casaria de Amarante./
Lembro os sítios bucólicos... A ponte/
No manso riacho, onde brinquei menino,/ Curvado sobre a gruta, a ouvir a
fonte.../
A igreja... E ouço, meu Deus! A voz do
sino,/ Como a repercutir no amplo horizonte/ O repique augural do meu
destino!”
Finalmente, temos o elegíaco, em
Verônica, um dos livros mais tristes da língua portuguesa, com versos que
lembram a dolorosa acentuação de Leopardi, sobretudo em sua 2ª parte, a que
intitulou Imagens do Amor e da Morte e se inicia com o soneto “Como uma
sombra luminosa” e atinge momentos de alto desesperação, todos a lembrar a
presença-ausência da amada morta e a serena desolação de tê-la perdido. Não
vamos repeti-los nesta breve leitura, mas numa outra que pretendemos ainda
fazer do excelso poeta.
Martins Napoleão, também um dos nossos
grandes poetas, há pouco celebrado, em nossa Academia, no transcurso do seu
centenário, na palavra erudita e culta do acadêmico Celso Barros, tocado pela
desventura do poeta, deixou-nos seu desalento, num poema de revolta contra o
destino pela perda da memória do inolvidável poeta, de expressão tão
identificada com o sentimento de nossa gente:
“Criaste de novo o mundo à feição do
teu sonho,/ enquanto os deuses criaram uma só vez, e por isso talvez o castigo
medonho,/ como o raio que cai no carvalho montês.”
“Teu cérebro anoitece em sombra. E a
esperança/ diz ainda ao coração os últimos adeuses.../ - a demência é de certo
ainda a melhor vingança/ dos deuses contra quem foi maior do que os deuses...’