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DAS OBRIGAÇÕES NÃO CUMPRIDAS
20/01/2011 00:09:49


M. Paulo Nunes

 A imagem que me vem à mente, neste instante, é ainda a do velho Senador Milton Campos, objeto de nosso comentário anterior. Como era ele  também, como nós outros, leitor compulsivo, dizem que costumava lamentar-se, com freqüência, do acúmulo de livros em seu escritório à espera do momento de lê-los, obrigação esta adiada por falta de tempo, o que lhe causava o mesmo remorso que a todos acomete pelos livros não lidos ou no caso de quem escreve, os assuntos sobre os quais não se escreve.

E aí é aquele desfilar de casos e situações de que a consciência nos acusa, a consciência, tão presente em cada um de nós que é capaz de nos levar para o inferno, como observa Rachel de Queiroz.

Um dos remorsos que guardo comigo, talvez para sempre, é o de não haver escrito ainda o estudo definitivo que pretendia sobre Marcel Proust, sobre Eça ou ainda a respeito de Jorge Luis Borges, o primeiro deles, leitura de grande parte da vida, e os dois outros, autores de cabeceira. Ou ainda sobre Vergílio Ferreira, representante maior do romance português contemporâneo, com quem cheguei ainda a corresponder-me, a propósito de pequenas notas de crítica que lhe dediquei e a quem prometi fazer tal estudo, que entretanto, não fiz nem mais o farei, ao que suponho.

Dos contemporâneos ainda, com quem convivi, em certa fase da vida, ainda estou a dever um estudo sobre o saudoso poeta Domingos Carvalho da Silva, expoente da geração de 45, com quem convivi em Brasília, quando cumpri ali o meu exílio voluntário. Ou ainda por conta da boa convivência naquela cidade, estudo sobre os poetas e excelentes amigos Anderson Braga Horta (que grande poeta!) e Antônio Carlos Osório, figuras que dignificam a alta poesia em língua portuguesa. Anderson, além do mais, escreveu notável estudo, dos melhores que já li, sobre Da Costa e Silva.

 O que nos absolve em parte da angústia de nada ter feito para saldar esses compromissos é o fato de Jorge Amado, e era Jorge Amado, ter anunciado, durante muito tempo, seu famoso romance Boris, o Vermelho, que jamais escreveu. Da mesma forma Aníbal Machado, animador da vida literária no Rio, nos idos de 1950, e autor daquela obra-prima do conto brasileiro: “A Morte da Porta-Estandarte”, de seu livro, no gênero, Vila Feliz, anunciou durante toda a vida o romance João Ternura, do qual chegou a divulgar vários capítulos, nos jornais literários, e nunca pôde publicá-lo.

O próprio Eça de Queiroz, e era Eça, anunciou como plano de romances, em sua carreira literária, uma espécie de comédia humana portuguesa, com o título de “Cenas da vida portuguesa”, a exemplo do que fizera Balzac com a sua monumental comédia humana em relação à sociedade francesa de sua época. Desse propósito resultou apenas Os Maias, que publicou com o subtítulo de “Episódios da vida romântica”.

Assim, não há coisa mais mutável e vária do que a vida literária e os seus mais solenes compromissos. Para a literatura talvez coubesse aquela caracterização do italiano para as mulheres: “la donna  è mòbile”!

Bandeira, em um poema, tentando captar a essência da vida ou a passagem do tempo, diz que ”a vida, passa... a vida passa/ e a mocidade vai acabar”. Que fazer?




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