M.
Paulo Nunes
Quando lecionei Português e posteriormente, Literatura
Portuguesa, no Liceu e na Faculdade de Filosofia, então dirigida pelo
inolvidável mestre Clemente Fortes, três monumentos literários daquela
Literatura me chamaram fortemente a atenção: o lirismo provençal ou
trovadoresco, sua primeira manifestação literária; a prosa história de Fernão
Lopes, cronista-mor do Reino e autor das Crônicas de D. Pedro, o penúltimo rei
da dinastia Afonsina, o inditoso amante de Inês de Castro, a que depois de
morta foi rainha, cujo martírio foi celebrizado no Canto III dos Lusíadas,
de Luís de Camões, a Crônica de D. Fernando, o último rei dessa
dinastia, a Crônica do Condestável (a vida de D. Nuno Álvares Pereira,
herói de Aljubarrota), e a Crônica de D. João I, o rei de “Boa Memória”,
fundador da dinastia de Aviz e filho natural de D. Pedro I. O teatro vicentino
que não teria continuadores em Portugal, mas em Espanha, com Calderon de la
Barca e Lope de Veja, seria outra dessas manifestações, já nos primórdios da
Renascença. Fora ele sumariamente revivido no século XIX, por Garrett, em sua
prosa dramática, com Um Auto de Gil Vicente. No Brasil é que seria essa
forma dramática reconstituída, por Ariano Suassuna, com o Auto da Compadecida.
A simplicidade do lirismo provençal é que
teria presença dominante naquelas aulas, mediante a singeleza de suas famosas
“cantigas de amor”, quando falava o namorado, ou nas “cantigas de amigo”,
quando o trovador punha as palavras na boca de uma mulher e aí era ela quem se
declarava ao amado.
Por toda a poesia de língua portuguesa
perpassa esse sopro lírico que vem da escola provençal e está presente em
Camões, com as suas canções, em Garrett, de modo especial o de Adozinda,
em Gonçalves Dias (lembremos a simplicidade da “Canção do Exílio”), em Manuel
Bandeira, em Vinicius de Moraes, em Carlos Drummond de Andrade, ou em H Dobal.
Em Atalhos, obra de estréia de José Lobão, que
aqui agora é lançado, nesta Academia, com pompa e circunstância, segue o autor
esse mesmo filão, utilizando, inclusive, em algumas composições, um metro
multissecular que vem da poesia dos trovadores, a redondilha (maior e menor),
os versos de 7 (sete) e de 5 (cinco) sílabas, respectivamente, metros de que se
serve o poeta em alguns poemas deste livrinho. Destacaria “Desventura” e
“Saudade da Bahia”, redondilha maior), Graúna” (redondilha menor), como os mais
representativos dessa coletânia, além de recorrer ao vetusto modelo do soneto
como naquele em que evoca a figura do avô, “Consternação”, dos mais
emocionantes desta recolta.
O livro contém ainda uma parte de prosa, que se constitui
do discurso proferido ao tomar posse do lugar de deputado, em nossa Assembléia
Legislativa, no início de uma brilhante carreira política, tão cedo interrompida;
da oração proferida nesta Casa, em nome da família, na homenagem prestada ao
excelso poeta Martins Napoleão, em seu centenário de nascimento, e de um conto
intitulado “A Mulher Nua”, das melhores e mais expressivas produções no gênero,
entre nós.
Ao apresentar o poeta ante um público tão numeroso e
receptivo, quis significar também sua importância como pessoa humana, das
melhores que conheço, pela lhaneza de trato, a elegância de maneiras, a
humanidade e simpatia.
Isso me motivou a que tudo fizesse para estar presente
àquela festa de lançamento, retornando a tempo do Rio de Janeiro, por uma das
rotas aéreas mais longas que jamais percorrera para não faltar ao compromisso
assumido. Ali estivera para receber a homenagem da Academia Brasileira, que me outorgara,
a 15 de dezembro passado, a Medalha João Ribeiro, pelos relevantes serviços
prestados à cultura brasileira, conforme reza o diploma que me foi entregue
também naquela oportunidade.