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A VERDADE DOS DIÁRIOS
20/01/2011 00:09:24


M. Paulo Nunes

 Sou um compulsivo leitor de diários, esse tipo de confissão que escritores famosos fazem como se estivessem falando de um autor póstumo a um público inexistente. Daí os equívocos que eles têm trazido a muita gente ilustre que se vê agredida pelo que neles se contém.

A nossa literatura, contrariamente ao que ocorre na francesa, não é muito pródiga em diários. Lembro-me de haver lido apenas dois, ambos de caráter puramente literário: o de Álvaro Lins, o excelente crítico literário que tivemos e tão cedo desaparecido, Notas de um Diário de Crítica, dado à estampa em 1943, pela Livraria José Olympio, que creio ter ficado apenas no 1ºvolume, o Diário Crítico, de Sérgio Miliet, um excelente crítico literário paulista, partícipe da Semana de Arte Moderna, de 1922, lido há bastante tempo, e ainda o Diário Secreto, de Humberto de Campos,que tanta celeuma provocou,à época em que apareceu, nas páginas da revista O Cruzeiro. Alguns contemporâneos seus, companheiros de geração, reagiram com igual violência, ao se sentirem atingidos, não apenas por uma pena tingida da melancolia de Machado de Assis, mas de uma crueza e virulência de fazer inveja aos polemistas famosos de nossa língua, como Eça, Camilo e  Ramalho, em Portugal e, no Brasil, Carlos de Laet e Agripino Grieco.

Em duas notas sobre o assunto em seu livro de reminicências literárias tantas vezes aqui citado, Reencontro com meus Mestres, refere o caso de Joaquim Nabuco, cuja obra autobiográfica, Minha Formação, contém alguns trechos de seu Diário, e o Diário de André Rebouças que supõe ele estar arquivado, ainda inédito, na Fundação Joaquim Nabuco, do Recife.

Lembra ele ainda a preferência do autor de Memórias Póstumas de Brás Cubas  pelo gênero, como demonstra pela escolha do título de alguns de seu romances, como o Memorial de Aires e o conto Galeria Póstuma, de seu livro Várias Histórias, com os excertos do diário de Joaquim Fidelis de que somente depois de sua morte se veio a tomar conhecimento, porquanto só então foi revelada “essa espécie de memórias secretas, confidências do homem a si mesmo”.

Diz ali o narrador: “O interesse do escritor adormece a dor do objeto. Era um livro digno do prelo. Muita observação política e social, muita reflexão filosófica, anedotas de homens públicos, do Feijó, do Vasconcelos, outras puramente galantes, nomes de senhoras, da Leocádia, entre outros; um repertório de fatos e comentários.” (Ob. cit. p. 106.)

Por fim, last but not least, Josué Montello, com sua notável  prosa diarista, já em outro lugar referida, com os livros Diário da Manhã, Diário da Tarde, Diário do Entardecer e Diário da Noite Iluminada, com que enriquece,  no gênero, a nossa literatura.

Mas vamos encerrar o comentário.

Na primeira daquelas notas, há a narrativa de um fato pitoresco ocorrido quando da visita ao Brasil do celebrado porta e diplomata francês Paul Claudel.

Chama-nos o romancista a atenção para o que diz Claudel no seu journal, em dois volumes papel bíblia, com a data de 27 de maio de 1917, quando no desempenho de sua função de embaixador da França, sobre um dos numes tutelares de nosso país: “Vi Rui Barbosa na sua biblioteca, frágil como um inseto e cor de tabaco”. (Ob. cit.p. 108).

“Vejam agora, diz-nos o autor de Os Tambores de São Luís, o que disse o mesmo Claudel, como embaixador, ao entregar a placa da Legião de Honra a esse mesmo inseto: ‘Senhor Conselheiro: - No dia de nosso jubileu como tribuno, neste aniversário de vosso ingresso na vida do espírito que sempre foi para nós a vida em ação, a França inteira se associa à admiração e ao respeito de vossos compatriotas que disso nos dão testemunho em toda parte.” (Ob. cit., idem).

Pergunta o autor da nota onde estaria a verdade, no Claude do diário ou no Claudel do discurso? Nos dois, responde ele.

“...Há uma verdade da História e uma verdade do Diário. Aquela reflexiva, conclusiva e documental;esta, momentânea, ocasional e impulsiva.”. (Ob. cit., p. 108)  

 

 




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