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A GRANDE NOVA
20/01/2011 00:09:19


M. Paulo Nunes

                        Não sei se aqueles dez leitores com os quais dizia contar o velho Machado de Assis, ou mesmo cinco, reduzindo-os ao essencial, terão acompanhado nessas notas o embarque de Maria Eduarda para Paris, na Estação de Santa-Apolônia, em um vagão de luxo, tomado pelo Vilaça, toda de preta, parecendo uma rainha de romance, como diria o procurador.

Passemos à palavra ao narrador:

“Ega, que viera cedo, com o Vilaça, acabava de despachar a sua bagagem para o Douro, quando avistou Maria, que estava trazendo Rosa pela mão. Vinha toda envolta numa grande peliça escura, com um véu dobrado, espesso como uma máscara: e a mesma gaze de luto escondia o rostozinho da pequena fazendo-lhe um laço sobre a touca... Ega correu para Maria Eduarda, conduziu-a pelo braço, em silêncio, ao vagão-salão que tinha todas as cortinas cerradas. Junto do estribo ela tirou devagar a luva. E muda, estendeu-lhe a mão.

“- Ainda nos vemos no Entroncamento – murmurou Ega. – Eu sigo também para o Norte. ((Ob. cit., p. 433)

Diante da curiosidade de alguns sujeitos que pararam “ao ver sumir-se naquela carruagem de luxo, fechada, misteriosa, uma senhora que parecia triste, coberta de negro”, apenas Ega fechou à portinhola, o Neves, o da Tarde e do Tribunal de Contas, rompeu de entre um grupo, e arrebatando-lhe o braço com sofreguidão, perguntou-lhe quem era.

“Ega arrastou-o pela plataforma, para lhe deixar cair no ouvido, já muito adiante, tragicamente:

- Cleópatra.

“O político, furioso, ficou rosnando: - ‘Que asno! Ega abalara. Junto do seu compartimento Vilaça esperava, ainda deslumbrado com aquela figura de Maria Eduarda, tão melancólica e nobre. Nunca a vira antes. E parecia-lhe uma rainha de romance.

“Acredite o amigo, fez-me impressão! Dá-nos uma bolada, mas é uma soberda praça.” (Ob. cit., p. 433).

O comboio partiu e o Neves, do Tribunal de Contas, ainda furioso, vendo o Ega que também embarcava, atirou-lhe, disfarçadamente, um gesto obsceno.

A grande novidade que Carlos ciosamente guardara da curiosidade do amigo até o seu reencontro em Lisboa, fora a do casamento de Maria Eduarda. O assunto veio à tona quando da visita de ambos ao Ramalhete.

“Assim o anunciara ela a Carlos numa carta muito simples que recebera na quinta dos Vila-Medina. Ia casar. E não parecia ser uma resolução tomada arrebatamente, sob um impulso do coração. Ela aludia nessa carta a ter ‘pensado muito, refletido muito...’ De resto o noivo devia ter perto de cinqüenta anos. E Carlos portanto via ali a união de dois seres desiludidos da vida, maltratados por ela, cansados ou assustados do seu isolamento, que sentindo um no outro qualidades sérias de coração e de espírito, punham em comum o seu  resto de calor, de alegria e de coragem para afrontar juntos a velhice...” (Ob. cit. p. 464)

Na carta ela ainda lhe dizia: “sou apenas mais nova que o meu noivo seis anos e três meses”. Ele se chamava Mr. de Trelain e de tratava “evidentemente de um homem de espírito largo, desembaraçado de prejuízos, duma benevolência quase misericordiosa, porque quisera Maria, conhecendo bem os seus erros”. (Ob. cit., idem).

A uma pergunta de Ega se ela continuava a viver em Orleães, Carlos respondera que vivia ao pé de Orleães, numa propriedade que ali adquirira, chamada Les Rosières. O noivo habitava nos arredores, pois ela o chamava de “vizinho”. “E era naturalmente um gentilhomme campagnard, de família séria, com fortuna.” (Ob. cit., idem)

A uma pergunta do amigo se ela só tinha de seu o que ele lhe dava, Carlos respondeu já lhe haver contado aquilo por carta, ou seja, que ela se recusara terminantemente a receber parte alguma da herança a que teria direito e que o Vilaça arranjara as coisas por meio de uma doação correspondente a doze contos de réis de renda.

“_ E que efeito te fez isto?

- Um efeito de conclusão, de absoluto remate. É como se ela morresse, morrendo com ela todo o passado, e agora renascesse sob outra forma. Já não é Maria Eduarda. É Madame de Trelain, uma senhora francesa. Sob este nome, tudo o que houve fica sumido, enterrado a mil braças, findo para sempre, sem mesmo deixar memória... Foi o efeito que me fez.” (Ob. cit., p. 466)   




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