M. Paulo Nunes
Foi uma
bela sessão a que se fez sábado passado, em nossa Academia, comemorativa do
centenário de nascimento do poeta o acadêmico Martins Vieira, figura de realce
do que há de melhor e mais representativo da cultura literária e da
intelectualidade piauiense. Professor, magistrado, jornalista combativo e poeta
dos de mais altos vôos da inspiração, era ele figura de escol como poucas que
conheci em nosso meio intelectual.
Dos
dois oradores que lhe traçaram o perfil intelectual, Celso Barros Coelho, essa figura ímpar de
nossa cultura literária, jurídica e humanística, de nossa terra nos dias
atuais, em sintonia com as idéias e os problemas de nosso tempo, ao falar, em
nome da Casa de Lucídio Freitas, pôde dar-lhe a dimensão que merecia o autor
alcandorado do Canto da Terra Mártire,
poema ao qual já pude referir-me anteriormente, em breve estudo, e cuja
estrutura, como ali destaquei, lembra a mesma concepção de uma das partes
constitutivas do poema de Dante, A Divina
Comédia – O Inferno.
José
Júlio Martins Vieira, cujo discurso admirável, em nome da família do
homenageado, se emparelha, sem nenhum favor, ao lado dos melhores que já foram
proferidos, naquela Casa da cultura piauiense, pela linguagem escorreita, pela
elevação das idéias e pela análise literária e empatia, com que falou da obra
do pai ilustre, a todos emocionou pelo brilho de sua oratória das mais
perfeitas.
Foi
aquele um dos grandes momentos que vivemos naquela Academia, como salientou o
seu presidente, Paulo Freitas, em sua breve e emocionada intervenção. Se
Martins Vieira não vier a merecer outras homenagens, em seu centenário, e creio que as receba ainda,
aquele instante solar de sua gloriosa vida intelectual viverá para sempre como
um dos melhores.
Ao
traçar com segurança o perfil intelectual do homenageado, José Júlio o fez com
mestria e competência, revelando-se, não apenas um grande orador, dos melhores
sem o galardão acadêmico que já freqüentaram aquela tribuna, como ainda um
crítico literário e estudiosos da obra do pai, que demonstrou conhecer em
profundidade.
Vamos
tentar, neste breve espaço, resumir-lhe a mensagem. Destacou ele, inicialmente,
o jornalista combativo e corajoso, na luta impertérrita contra o Estado Novo
getulista, emparelhando-se às figuras notáveis do nosso jornalismo de combate,
como Eurípides de Aguiar, Simplício Mendes, Ofélio Leitão, porfiando por
devolver ao país, em nossa terra, o sistema republicano de governo,
restaurando-lhe o estado de direito democrátivo, a liberdade usurpada e as
franquias democráticas. Não conheço entre nós quem melhor o fizesse do que ele
e os dois outros luminares já citados.
Referiu,
a seguir, as Getulíadas, uma
paráfrase do poema camoneano que eu me lembro eram lidas às ocultas, sob o
guante da censura, em que vivia o país, como obra proibida, cujos originais
circulavam de mão em mão para serem em seguida publicados na imprensa de
combate, com a abertura demorática da campanha de 45, após a famosa entrevista
concedida por José Américo de Almeida, a Carlos Lacerda, no Correio da Manhã, em fevereiro daquele
ano, que abriria as portas da censura à circulação das novas idéias de
liberdade.
Em
seguida, a sua análise perfeita do Canto
da Terra Mártire, sobre a tragédia da seca nordestina, verdadeiro canto de
exaltação do martírio de um povo, o nordestino, que ainda hoje continua a
sofrê-lo com a mesma intensidade e resignação, não obstante as promessas vão
dos pregoeiros de soluções miraculosas nunca efetivadas, porque desligados do
compromisso com a solução de tão magro
problema que vem, ao longo do tempo, servindo de pasto à cobiça de políticos e
administradores inescrupulosos, os contamazes fregueses do erário público, com
a famigerada indústria da seca. Até quando?
Finalmente,
destacou ele o primoroso cultor do soneto, essa vetusta forma de composição
poética a que ele daria o realce e a elegância de um Bilac, com a preferência
pelo verso alexandrino, o mesmo metro utilizado naquele Canto.
Não
esqueceria ainda o ensaísta, estudioso dos problemas sociais do país, como o
demonstra a bela conferência, verdadeiro poema em prosa, na série de
conferências realizadas em 1944, e intitulada “Unidade Geográfica do Brasil”
promovida, por sinal, pela Interventória Federal no Estado.
Concluiríamos
esta nota breve com a oportuna citação de Celso Barros, em seu discurso,
colhida na tragédia clássica Antígona,
do grego Sófocles, que vem aqui muito a propósito; “Haverá para os filhos
tesouro maior que a glória dos país?