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M. Paulo Nunes
Em um dia de muita veemência no debate acadêmico, como ocorre com freqüência em nossa Academia, a propósito do transcurso do aniversário de fundação dos cursos jurídicos no país, pude, entretanto, aproveitar um aparte para assinalar também naquela data a passagem do centenário de nascimento do pensador brasileiro e também militante político da vanguarda, Caio Prado Jr.
E dizia naquela oportunidade que o notável historiador paulista se insere naquela ordem de pensadores que vem de Joaquim Nabuco, com O Abolicionista, em 1883, e tem continuidade com Os Sertões, de Euclides da Cunha, em 1902, Manuel Bonfim e o seu América Latina – Males de Origem, de 1916, Oliveira Vianna, com Populações Meridionais do Brasil, de 1923, Gilberto Amado, com As Instituições Políticas e o Meio Social do Brasil, 1924, Gilberto Freyre, com Casa Grande & Senzala, em 1933, ano seminal em que apareceram Sérgio Buarque de Holanda, com Raízes do Brasil, e o próprio Caio Prado Jr., com Evolução Política do Brasil, tentativa de interpretação dialética da história brasileira, seguido, em 1940, por Formação do Brasil Contemporâneo. Todas elas obras fundamentais do pensamento brasileiro, cuja preocupação dominante é a interpretação da realidade social e política do Brasil, e que não deveriam faltar na estante de todo estudioso por ventura preocupado com os problemas fundamentais de nosso país.
Caio Prado Jr. foi assim um desses luminares. Oriundo da alta aristocracia paulista, a dos Prados, filho de Caio Prado e de D. Antonieta Diniz Prado, estudou no Colégio São Luís (1928), tendo-se formado em ciências jurídicas e sociais na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1924, aos 21 anos.
Começou sua militância política no antigo Partido Democrático, em 1918, tendo participado da revolução de 30, distinguindo-se assim como ativo partícipe dos acontecimentos políticos das décadas de 20 e 30 no país. Filiando-se muito cedo ao Partido Comunista, visitou a então União Soviética em 1933, tendo publicado no ano seguinte um livro de viagem e impressões daquele país, com o título URSS, um Novo Mundo (1934). Acusado de participação na chamada Intentona Comunista, de 1935, por haver sido um dos dirigentes da Aliança Nacional Libertadora, foi preso e em seguida exilado do país, de 1937 a 1939. De volta ao país, em 1940, é que publicou o livro clássico da historiografia brasileira, já antes referido, Formação do Brasil Contemporâneo, ao qual se seguiram ainda, História Econômica do Brasil (1945), Estruturalismo e Marxismo (1971) e História e Desenvolvimento (1972). Faleceu na mesma cidade de São Paulo, onde nasceu, em 23 de novembro de 1990, aos 83 anos.
Há ainda a destacar, na vida luminosa de Caio Prado Jr., sua atividade cultural como editor, tendo fundado com seu amigo Monteiro Lobato a Editora Brasiliense e a Gráfica Urupês, que passou a editar a Revista Brasiliense, que teve suspensa sua publicação à ordem da repressão política. Eleito Deputado Estadual de São Paulo, em 1947, teve seu mandato cassado, juntamente com o de todos os dirigentes políticos do Partido Comunista, no governo Dutra, inclusive o mandato de senador de Luís Carlos Prestes, como conseqüência da onda de repressão que se instalou no país, no período da Guerra Fria.
Com o golpe militar de 1964, sofreria Caio Prado Jr. novas turbulências em sua vida de militante e pensador político, tendo tido cassados seus direitos políticos. Exilado no Chile e preso em sua volta ao país, em 1971, condenado por subversão pelo Superior Tribunal Militar, ocorre um fato surpreendente em sua vida pública: o Supremo Tribunal Federal concede-lhe hábeas corpus em votação unânime e consagradora.
Esta é portanto um das personalidades mais fascinantes capazes de dar uma dimensão excepcional ao breve e tormentoso século vinte em nosso país e por tudo isso deverá ser lembrada.
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