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OS INTELECTUAIS E O PODER
12/01/2011 00:08:12


                                              M. Paulo Nunes

       Já tratamos do assunto nesta coluna, vem ele agora à baila a propósito da nomeação da artista Ana Holanda para o cargo de ministra da Cultura do novo governo.

        Tenta-se relacionar maldosamente o ato com a defesa dos interesses profissionais e financeiros do compositor e romancista Chico Buarque, em virtude da relação íntima de parentesco entre os dois, o que me parece improvável.

        Quem abordou da questão, com a maior relevância, nas letras francesas, foi o filósofo Raymond Aron, no estudo a que intitulou O ópio dos Intelectuais, em que focaliza a sedução dos intelectuais pelo pensamento de esquerda. O mesmo faria o filósofo Norberto Bobbio, em seu livro marcante, e mais recente, Os Intelectuais e o Poder.

        Esses autores aqui lembrados “a vol d’oiseau”, apenas complementaram o que o fizeram antes deles duas grandes figuras literárias, um, da “belle époque”, o francês Julian Benda, em seu livro marcante, La Trahison des Clercs, e o norteamericano Archibald Mac Leish, em seu livro, Os Irresponsáveis, este, em nosso dias.

        Segundo o primeiro deles, Benda, o intelectual e o artista, na condição de “clérigo”, deverá manter-se íntegro, dedicado por inteiro à sua arte, não deixando permeá-la pelos problemas de seu tempo. Enquanto, para o segundo, o intelectual ou o artista, como cidadão participante que também o é, não pode fugir ao debate dos problemas sociais de seu tempo.

        O caso mais edificante em relação ao tema se relaciona com a discussão entre Sartre e Merleau-Ponty, explicitada na famosa correspondência entre os dois filósofos do existencialismo contemporâneo, mantida inédita até a morte dos dois, a de Merleau ocorrida em 1961, e a de Sartre, somente em 1984.

        A Folha de São Paulo, em seu suplemento Mais!, já desaparecido, de 14 de agosto de 1994, publica aquela famosa correspondência, até há pouco inédita, constante de duas cartas de Sartre  e de uma, de Merleau-Ponty, da qual resumimos aqui os tópicos mais salientes.

        O cerne da discussão se situa no envolvimento cada vez mais crescente de Sartre na discussão política, relegando a segundo plano as preocupações de seu “cogito” filosófico, do qual se sentia de certa forma indissociado o autor de Fenomenologia da Percepção.

        Sartre chega ao ponto de dizer que a obra dos primeiros tempos de sua atitude filosofante – O Ser e o Nada, deveria ser deixada inteiramente de lado, pois o que lhe importava, acima de tudo, era a solução imediata dos problemas decorrentes da “guerra fria”, posicionando-se ele, deliberadamente e sem maior vexame, ao lado dos comunistas, o que  para Merleau-Ponty parecia absurdo, sobretudo após sua lição no Colégio de França, em 1953, quando critica abertamente o autor de O Existencialismo é um Humanismo.

        Referindo-se àquela aula inaugural antes mencionada, Sartre afirma que Merleau-Ponty possui uma concepção da filosofia que só aparentemente permitiu conciliá-la com a política, mas, realmente, torna impossível “jogar nos dois tabuleiros”. A política, segundo ele, é ação fundada numa escolha objetiva, a partir dos dados e fatos disponíveis. Se a filosofia for, como pretende Merleau-Ponty, a exigência de, antes de escolher, colocar-se num distanciamento que permite apreender totalidades parciais e não os fatos isolados que formam nossa experiência cotidiana, então, para o autor de Sursis, “um filósofo de hoje não pode tomar uma atitude política”.

        Quanto à afirmação de Sartre de que Merleau adotava em face da política uma “atitude sonhadora”, responde este: “eu teria renunciado à política, por haver escolhido a filosofia, à semelhança de alguém que, entre várias profissões, escolheu a de alpinista”.

        Não vamos pinçar mais nada desse debate interessante, mas, aparentemente, interminável, apenas para  significar-lhe a importância no quadro tumultuado dos dias atuais. A discussão continua.

       

 




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