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VARGAS LLOSA E SUA MENINA MÁ
06/01/2011 00:10:37


                                                                  M. Paulo Nunes

O assunto já foi abordado em outra oportunidade, nesta coluna, mas volta agora à tona em virtude do interesse despertado pela escolha do novo Nobel de Literatura, especialmente por parte da ala feminina do Conselho de Cultura, em que o assunto vem sendo discutido com o maior interesse.

É muito difícil para um leitor compulsivo como é o meu caso abandonar o contacto permanente com um escritor, principalmente se se trata de um narrador instigante como o romancista peruano Mario Vargas Llosa, ora agraciado pela Academia Sueca, um dos melhores representantes do romance hispano-americano da mesma altitude de um Gabriel Garcia Marquez (Cem Anos de Solidão, O amor nos Tempos do Cólera), de um Júlio Contazar (1914-84), de quem podemos destacar o contista, com os seus contos poemas, quase ensaios, de Bestiário, e o romancista de Rayuela, Os Prêmios e Modelos para Amar e, “last but not least”, Jorge Luís Borges (1899-1986), o eterno e infinito Borges que por si só daria assunto para uma vida inteira, se vida tivesse para (re) lê-lo. Fica-nos aquela observação do Conde de Idanha, um dos grandes camonistas, a respeito d’Os Lusíadas, para quem é este um livro grande demais para ler-se de uma só vez e muito pequeno para ler-se a vida inteira.

Depois de já nos ter dado A Festa do Bode, admirável painel social e político das ditaduras latino-americanas, fixando o período da infamante ditadura, (todas as ditaduras são infames, seja de que tonalidade forem) do tirano da República Dominicana, Rafael Leônidas Trujillo, e em seguida a saga da vida do pintor Paul Gauguin em O Paraíso na Outra Esquina, agora volta à melhor literatura erótico-sentimental, com este seu novo romance Travessuras da Menina Má.

Voltando ao mesmo tema – o lirismo erótico-sentimental, retoma um pouco também a paisagem limenha, numa representação da alta burguesia do elegante bairro de Miraflores, em seus anos dourados da década de 50, em que aparecem as duas irmãs “chilenitas”, que depois verificou-se não serem sequer chilenas, mas peruanas da classe mais pobre do país, por uma das quais, a “chilena” Lily, se apaixona, perdidamente, com um desgraçado amor que lhe consome a vida inteira, aquele “soi-disant” jornalista, diplomata e escritor Ricardo Somocurcío.

A história começa nos anos 50 do século passado, naquele bairro da Cidade dos Reis, mas não para aí. Os dois personagens seguidamente se reencontram em Londres, Paris, Tóquio e Madri, “à medida que esse amor cresce e se transforma”, e converte aquela “menina má” na tormentosa paixão de Ricardo, um jovem de bons princípios e propósitos edificantes de vida, mas que se vê presa do terrível sortilégio daquela sedução irreversível que se transforma em perpétuo sofrimento por conta de um amor sem remissão. Como pano de fundo, aparecem neste romance sedutor a Paris revolucionária dos anos 60, a Londres das drogas, do amor livre e da cultura “hippie” ou da contra-cultura, que daria o tom àquela época de contestação e de mudança de valores, a Madri da transição política pós-Franco e a Tóquio dos grandes mafiosos.

No que tange à chamada intertextualidade, neste romance parecem cruzar-se várias tendências romanescas e poéticas. Começaria com um episódio da antiguidade clássica, qual seja o do livro IV da Eneida, de Virgílio, quando o fugitivo Enéas, ao abandonar o quadro de desolação da guerra de Tróia, parte em sua peregrinação marítima até Cartago, onde é acolhido pela rainha Dido que por ele perdidamente se apaixona. Ao abandoná-la, Dido se suicida com a espada deixada pelo herói troiano. O episódio inspirou a famosa “Cantata de Dido” do árcade português Correia Garção (1724-1772), que constitui um dos mais belos poemas da língua portuguesa.

Lembremos ainda o Marcel Proust (1871-1922), de um “Amor de Swann” (No Caminho de Swann) em que o narrador busca captar aquela obsessão de Carlos Swann por Odete de Crécy, motivada pela leve semelhança daquela “cocote” com um quadro de Botticelli. Ou igualmente, em nossos dias, em A Servidão Humana, de Somerseth Maughan (1874-1965), a  desvairada paixão de Philip por Mildreed, que converte num inferno a vida do protagonista, e levado à tela no grande filme interpretado por Leslie Howard e Bete Davis.

Tudo isto nos eleva este último livro de Vargas Llosa ao pedestal de uma de suas obras-primas, em um de seus achados do romance erótico-sentimental, em que é ele realmente mestre absoluto.

 




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